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1. Como se “seca” um jornal. Aqui, em Oliveira do Hospital, na Madeira, na Venezuela ou em qualquer outra parte do mundo onde existam pessoas que não conseguem coabitar com a liberdade de imprensa.

A receita é simples: “corta-se-lhe” a publicidade institucional, boicota-se-lhe o acesso à informação e, não raras vezes, consegue-se assim acabar com o mal pela raiz. Pois, contrariamente ao que cantava Zeca Afonso ainda há hoje muitos machados a cortar a raiz ao pensamento impresso em papel de jornal.

2. Os jornais regionais, muito por culpa dos sucessivos governos – incluindo este, já que a tutela da comunicação social tem tido as mesmíssimas políticas das anteriores – são, hoje, estruturas empresariais com grande debilidade financeira. 

Cozinhados

Os portugueses lêem pouco e, com a Internet, agora o cenário ainda é pior. Como não é fácil inverter essa realidade, os jornais – fundamentalmente os do interior do país –, têm então apenas uma outra fonte de receita: a publicidade.

3. Mas a publicidade – ou melhor, a falta dela! –, que o Governo quase concentra nos grandes órgãos de comunicação social de Lisboa e Porto – paradoxalmente, já vi campanhas publicitárias a apelar à limpeza das matas na caríssima revista do Expresso! –, está a asfixiar cada vez mais a imprensa regional, que só tem dois caminhos: ou se encosta ao poder local e “come”; ou cumpre o seu verdadeiro papel e passa a ter o estatuto de “persona non grata”.

4. Neste quadro – e com a cumplicidade do Estado português –, teremos sempre – salvo honrosas excepções –, uma imprensa subserviente aos poderes políticos e económicos e uma imprensa pouco profissionalizada e preguiçosa, porque mexer em determinados dossiês pode trazer maus resultados. Sobretudo, económicos.

5. Este é o cenário que o Correio da Beira Serra enfrenta. Depois de ter voltado a germinar em 2006 – por via de uma parceria estabelecida com um grupo empresarial –, há hoje, por incrível que pareça, muitos actores políticos a quererem silenciar o jornal que cada vez vem conquistando mais público. E qual é a receita? É a tal de que vos falei logo no início do texto: A Câmara Municipal, a Adito, a Eptoliva e muito do que gira à volta do poder local, nunca gastaram um tostão de publicidade no jornal mais lido de Oliveira do Hospital.

Portanto, se à falta deste ingrediente financeiro, juntarmos uma pitada de intimidatórios processos em tribunal e ainda uns pózinhos de boicote informativo, está o “cozinhado” pronto para envenenar a liberdade de imprensa que tanto custou a alcançar.

Henrique Barreto

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