Há mais de 3 mil veados a viver em estado selvagem na Serra da Lousã e áreas envolventes. Estes animais são descendentes de cerca de uma centena reintroduzidos na Serra no final dos anos 90, numa altura em que a espécie estava extinta na Lousã desde meados do século XIX. O balanço da reintrodução, coordenada pela Unidade de Vida Selvagem (UVS) do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro (UA), faz deste um dos maiores êxitos nacionais e europeus entre os programas de fomento e conservação da biodiversidade. Os biólogos envolvidos garantem que “o veado é hoje em dia, definitivamente, um ex-libris de toda a Serra da Lousã, tendo um forte potencial económico, cinegético e turístico”.
Vinte anos depois “os resultados obtidos demonstram que a reintrodução de veados na serra da Lousã foi um sucesso, não só pela sua sustentabilidade biológica e ecológica, como também pelo número de efectivos e a área de distribuição actuais”, aponta Carlos Fonseca, coordenador da UVS e o biólogo que, desde a primeira hora, está por de trás do programa iniciado em 1995.
A partir desse ano e até 2004 foram reintroduzidos em diferentes concelhos da Serra – com destaque para os concelhos da Lousã, Figueiró dos Vinhos, Penela, Miranda do Corvo, Góis, Castanheira de Pêra e Pampilhosa da Serra – 120 animais provenientes da Zona de Caça Nacional da Contenda e da Tapada de Vila Viçosa. O objectivo era devolver à Lousã uma espécie emblemática extinta por acção do homem e voltar a ter na Região Centro de Portugal aqueles animais em estado selvagem.
A crescer entre o Mondego e o Zêzere
Vinte anos depois da monitorização regular das populações libertadas, quer a nível da densidade e abundância, quer a nível biológico e sanitário, a equipa de investigadores do Departamento de Biologia e do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar da UA, num artigo publicado no último número do International Journal of Biodiversity Science, Ecosystem Services & Management, apontar o enorme crescimento da população de veados ao longo do tempo e sublinha o sucesso no que toca à vasta distribuição geográfica dos animais. “A área de distribuição actual, superior a 90 mil hectares, é fruto da expansão dos veados em várias direcções, com especial destaque para Nordeste, ao longo da Cordilheira Central em direcção à Serra da Estrela, estando limitada a norte pelo rio Mondego e a sul pelo rio Zêzere”, refere a bióloga Ana Valente, uma das autoras do artigo agora publicado.
Esta investigadora lembra todo o “potencial económico, cinegético e turístico” que hoje os animais representam não só para os concelhos da Serra da Lousã como para toda a região envolvente. E se a actividade cinegética é hoje um importante motor de desenvolvimento da região, há também o eco-turismo, com destaque para a época de acasalamento que ocorre entre Setembro e Outubro, e que todos os anos atrai centenas de pessoas à Serra. A criação da Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto e, recentemente, da Associação de Desenvolvimento da Serra da Lousã (ADSL), são apenas algumas das iniciativas que floresceram com o objectivo de sensibilização ambiental, de exploração turística da Serra e de envolvimento das populações locais com os recursos naturais e culturais que a serra oferece.
Gestão de conflitos é aposta
“Esta ligação das populações à Serra da Lousã e à própria espécie têm especial importância para a sua gestão, bem como para a gestão de conflitos provenientes do aumento de distribuição do veado, sendo esta uma das missões de uma Associação criada recentemente pelos sete municípios que constituem a Serra da Lousã, a ADSL, da qual a UA fará parte”, sublinha Carlos Fonseca.
A monitorização da UA sobre os veados vai continuar, de modo a perceber-se as tendências populacionais e recomendar acções de gestão de acordo com indicadores biológicos e sanitários. Paralelamente, apontam os investigadores, “há que ter em mente a nível social estratégias de gestão integrada, onde participem as autarquias, o poder central, as unidades e centros de investigação, as associações, federações e empresas ligadas à actividade cinegética e ao turismo”. Também os conflitos provocados pelos danos que estes animais, até pelo aumento da distribuição desta espécie, causam nas culturas agrícolas “têm que ser geridos da melhor forma, numa perspectiva global”.