Bruno Amado foi um dos dois únicos elementos do PSD a conquistar a presidência de uma Junta de Freguesia no concelho de Oliveira do Hospital, um território dominado quase na totalidade pelo PS. Este engenheiro civil, de 36 anos, confessa que nunca pensou ganhar. “Pensava apenas fazer uma oposição forte”, explica em entrevista ao CBS. Só se apercebeu que existiam reais possibilidades quando começou a contactar pessoalmente a população “Quando fizemos o porta a porta apercebemo-nos que as pessoas queriam mudar”, sublinha. E queriam mesmo. Entregaram-lhe a liderança da União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca da Beira com maioria absoluta. “Ficámos surpreendidos com esta vitória esmagadora”, refere. Ao mesmo tempo os eleitores, ofereceram a vitória para a Câmara Municipal ao recandidato socialista José Carlos Alexandrino. A vida de Bruno Amado, e da sua equipa, porém, não tem sido fácil. Acusa a Câmara Municipal de descriminar a sua autarquia. Diz que tem dificuldades em falar com o presidente José Carlos Alexandrino e que o município tem virado as costas a Santa Ovaia e Vila Pouca da Beira devido às cores partidárias. “Parece que existe uma espécie de ‘racismo’ político”, atira, numa entrevista onde explica que não tem o apoio da autarquia, nem para as obras que até já estavam em curso e que algumas que foram adjudicadas e publicadas na Base Gov simplesmente não se realizam. “A União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca da Beira não é igual às outras. É uma pedra no sapato socialista”, frisa
CBS – Sente-se descriminado pela Câmara Municipal de Oliveira do Hospital?
Bruno Amado – Como representante da União de Freguesias tenho esse sentimento. Desde a nossa tomada de posse, mais precisamente dia 23 de Outubro, temos tentado reunir com o executivo camarário, com o presidente alexandrino, para lhe dar a conhecer os problemas herdados e procurar soluções, bem como discutir ideias. Houve, na realidade, uma reunião em que apresentamos os nossos problemas, mas até hoje não teve qualquer efeito prático. Continuamos no mesmo impasse. Existe aqui uma espécie de ‘racismo’ político. Não deveria existir, de todo, esta guerrilha de cores partidárias. Os problemas são apresentados e não temos resposta. Se fossemos PS, se calhar, tínhamos tudo e mais alguma coisa. Como somos do PSD, o que do meu ponto de vista não deveria ser problema, porque estamos aqui todos para resolver os problemas das pessoas, só encontramos entraves. Há quem ainda não tenha entendido que a população achou que nós deveríamos ser a junta e que José Carlos Alexandrino deveria ser presidente da Câmara. Fomos mandatados para trabalhar em conjunto. Infelizmente posso dizer que não temos colaboração por parte dos serviços da Câmara Municipal, o que nos impede de fazer obras. Nem sequer conseguimos expor as nossas ideias. E em algumas intervenções, que gostaríamos de fazer, precisamos do apoio financeiro da Câmara e dos seus serviços técnicos. E não temos.
Qual a explicação para este estado de tensão?
A única que tenho é que a União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca da Beira não é para a Câmara Municipal igual às outras. É uma pedra no sapato socialista. Quando tentamos marcar outra reunião, existe sempre uma desculpa por parte da autarquia para não se realizar. Chegou mesmo ao ponto de eu tentar marcar uma reunião e do presidente me responder que não podia porque andava a reunir com outras freguesias e depois venho a saber que afinal nesse dia esteve a almoçar com todo o ex-executivo desta União de Freguesias. Como é que se entende isto? Temos obras pendentes, algumas em curso desde o anterior executivo, que estão dependentes dos serviços do município, quer em termos de financiamento, quer de fiscalização. E não temos respostas.
Há obras paradas por esses motivos?
Temos, por exemplo, a casa mortuária Vila Pouca da Beira que na campanha foi prometida uma comparticipação de 50 por cento por parte de José Carlos Alexandrino, mas até à presente data ainda não há nada. Curiosamente, essa obra começou no dia 29 de Setembro [as eleições foram a 1 de Outubro], mas o alvará só apareceu no dia 20 de Dezembro. Nesse período esteve num formato ilegal.
Como se encontra e empreitada neste momento?
A parte de fundações até à primeira laje foi executada com dinheiro da Irmandade, mas não avançou porque falta de dinheiro. Estamos fartos de pressionar para obter respostas. Tenho de dar justificações às pessoas que nos elegeram, porque em primeira instância é a nós que pedem responsabilidades. Só que não somos os culpados. Basta referir que para cumprir a nossa parte dos 25 por cento do valor da obra temos de cumprir requisitos que têm de vir do município. A ideia era continuar a aguardar. Mas nesta última Assembleia Municipal fiquei estupefacto quando vi discutido o subsídio para a mortuária das Seixas, na freguesia do Seixo da Beira, e a casa mortuária de Vila Pouca ficar esquecida. Senti que a solução passava por sermos nós a fazer algo. Apercebi-me que se nós não avançarmos, o problema não se resolve.
E qual é a solução?
Já demos conhecimento à Irmandade das Almas de S. Miguel para avançarem com a obra. Vamos disponibilizar de imediato os 25 por cento da verba, 20 mil euros, com os quais nos tínhamos comprometido, mais cinco mil, dentro do cumprimento da lei. Essa foi a verba que a irmandade considerou necessário para concluir a parte estrutural. O restante depois terá de ser a Câmara a financiar. Em campanha eleitoral, o presidente da Câmara prometeu financiar em 50 por cento. Agora diz que afinal são 50 por cento, mas com um limite de 30 mil euros e não os 40 mil, correspondentes aos 80 mil da totalidade da empreitada. Vamos cumprir a nossa parte, a Câmara terá de fazer a sua ou justificar-se perante a população.
Esta é a única obra em que tem sentido problemas?
Há mais. Continuo, por exemplo, a aguardar pela empreitada que foi adjudicada por ajuste directo em 21 de Setembro de 2017 [as eleições foram a 1 de Outubro] e que deveria estar concluída em 60 dias que se refere à pavimentação nas Freguesias de Ervedal da Beira, Travanca de Lagos e União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca de Beira. O contrato existe, está na Base Gov, mas não vi uma única rua pavimentada. Perguntei quais seriam e quando, mas não recebi resposta. Já me disseram que existiu um erro e as ruas não se referiam à União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca de Beira, mas sim a Lourosa. Como se podem enganar nas aldeias? Como é possível assinar um contrato e não saber o que se está a assinar? Continuamos a aguardar respostas.
Tem também mostrado preocupação com os efeitos causados pelos incêndios….
Mais uma vez não recebo resposta da Câmara. Uma das nossas preocupações tem a ver com as linhas de água e a consolidação dos solos, especialmente nos taludes. Os incêndios acabaram por retirar consistência mecânica aos solos e com as chuvadas os solos perderam a vegetação que ajudava à estabilização. Os resíduos estragaram muitas linhas de água. O senhor presidente da Câmara assinou um protocolo no valor de 450 mil euros com a Agência Portuguesa do Ambiente para a requalificação hidrográfica do concelho. Só que até agora, e temos uma freguesia com 750 hectares, ainda não fomos contactados para apresentar candidaturas para os nossos problemas. E custa-me estar a receber constantemente reclamações das pessoas e ser completamente impotente para resolver o problema. Se temos dinheiro e meios para intervir estamos à espera de quê?
Considera que este processo não está a ser bem gerido?
Não me parece. Defendo que devemos cancelar as nossas festas devido a este fenómeno que nos assolou. Virarmos as costas às coisas que não têm sumo. As pessoas querem as suas vidas de volta. Vamos deixar-nos de homenagear entidades públicas que são pagas a peso de ouro para as funções que desempenham e homenagear sim as pessoas do concelho que lutaram pelas suas vidas e, em especial, aquelas que a perderam. Não entendo como é que a Câmara ainda não avançou com um memorial para as vítimas. Devíamos estar focados em fazer renascer e defender o concelho. Porque é que a CCDR entrega os projectos a engenheiros e arquitectos de Lisboa. O Dinheiro vem para cá, mas não fica cá. E na região Centro temos imensos engenheiros e arquitectos qualificados que poderiam fazer esse trabalho. Porque devem ser pessoas de Lisboa a realizar os projectos de arquitecturas quando temos técnicos capazes no concelho para realizar esse trabalho? Gostava de ver publicado quanto é que custam esses projectos e quanto custariam se fossem realizados por pessoas da terra. Deveria ser através de concurso público. Ninguém defendeu isso.
A transição de poder do anterior para o seu executivo também não parece ter sido pacifica…
Não foi. Encontrámos muitos entraves e uma série de irregularidades que transitaram do anterior executivo. Demos conhecimento ao executivo da Câmara que havia falta de documentos, uma série de assuntos que tinham de ser tratados porque comprometiam os serviços da União de Freguesias. A Câmara diz que estes casos lhe são alheios, o que não entendo uma vez que ela própria financia determinados projectos. Quando pedimos os documentos recebemos ao anterior executivo recebemos uma carta provocatória, em tom de gozo, que não respondia em nada àquilo que nós pedíamos.
Que irregularidades encontraram?
Várias. Os cheques foram todos rasurados para nos impedir de fazer face aos compromissos existentes, o que nos deixou de mãos atadas, sem capacidade de pagar aos funcionários ou saldar facturas. Todas as alterações para novos cheques demoram tempo. Só no fim de Novembro é que tínhamos parte do problema resolvido. Elaboraram contratos em período de gestão. A nível contabilístico o ano não foi fechado, continuando o ano de 2017 a ser lançado em 2016. Não há o fecho intercalar das contas e não há documentação para apresentarmos ao Tribunal de Contas como obriga a lei. Temos uma empreitada a decorrer sobre a qual não temos documentos. Nada do que devia ter sido feito em período de gestão foi realizado. Além disso, estava aqui um funcionário, que fazia parte da lista adversária, com contrato até 18 de Dezembro 2017, que quando se apercebeu que perdeu as eleições elaborou uma carta a rescindir o contrato. Mas no período de gestão fez um acto isolado no valor de 900 euros, o que significa aparentemente que ganhou duas vezes no mesmo mês. Isto demonstra que há aqui um abuso sobre o dinheiro que é do Estado, que é de todos nós.
Perante esta situação quais as medidas que tomaram?
Procurámos resolver a situação de forma pacífica. Não resultou e avançamos no dia 15 de Dezembro com uma queixa no Ministério Público de Oliveira do Hospital. Como não tínhamos qualquer resposta enviei vários e-mails, um deles para o DIAP de Coimbra. Responderam-nos que o processo estava em investigação. Mais recentemente fomos informados que o processo transitou de Oliveira do Hospital para Coimbra. Isto significa que não é palhaçada e que existe matéria para ser investigada, esmiuçada, para se perceber o que por aqui se passou.
Mas também foi pedida a sua destituição?
Pediram, mas estou completamente tranquilo. A base dessa argumentação prende-se com a obra da Casa do Campo que está a ser realizada na Freguesia pela empresa da qual sou gerente. Acontece que o contrato foi assinado pelo meu pai que na altura era o gerente. O auto de consignação já foi assinado por mim, mas em Abril ou Maio de 2017, numa altura em que não pensava ser candidato e muito menos presidente. Além disso, a empreitada tinha um prazo de execução de 120 dias, ou seja, estaria concluída em Setembro, antes das eleições. Só que surgiram problemas ao tentarem inserir uma rampa de acesso a pessoas com deficiências motoras num espaço que era de um particular. Nunca houve uma tentativa de adquirir aquele espaço de boa-fé. O confronto arrastou a obra para além do prazo previsto. Quando chegámos tivemos o cuidado de chamar a pessoa em causa para nos apresentar toda a documentação para se perceber se era de facto o proprietário, o que acabou por acontecer. Mais uma vez demos conhecimento ao presidente da Câmara e ele disse que tínhamos de resolver isso. Mas até à data nada. Já nos apercebemos que terá de ser este executivo da Junta a tratar da situação. Como sou presidente da junta e gerente da empresa, por uma questão ética, vou-me ausentar e nunca farei qualquer intervenção sobre o assunto. A legitimidade sobre este caso será exclusivamente do restante executivo como, de resto, está descrito na nossa primeira acta de executivo que qualquer pessoa da União de Freguesias poderá comprovar.
Como entende esta tentativa de o afastar da liderança da liderança da e União de Freguesias de Santa Ovaia e Vila Pouca de Beira?
É um pedido de alguém revoltado por estar a contar com uma vitória certa e acaba por perder para um adversário que vence com maioria absoluta.