O taxista acusado de ter disparado tiros de caçadeira contra operacionais que acorreram a um incêndio numa garagem e serralharia de Vale de Madeiros, no concelho de Nelas, começa a ser julgado na segunda-feira no Tribunal de Viseu. O homem de 64 anos está acusado de 12 crimes, entre os quais quatro de homicídio qualificado agravados, na forma tentada, e um de homicídio simples agravado, na forma tentada.
De acordo com a acusação, na tarde de 16 de Fevereiro de 2022, através de uma janela, o homem disparou contra bombeiros voluntários de Canas de Senhorim que foram combater o incêndio. Um bombeiro foi baleado numa perna, outro no abdómen e um terceiro num antebraço. Também um militar da GNR que estava a fazer um cordão de segurança para impedir a aproximação de pessoas ao local foi atingido numa coxa e uma mulher ficou ferida na cara.
A lista de crimes inclui ainda um de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, um de detenção de arma proibida, um de resistência e coacção sobre funcionário agravado e quatro de coacção agravados.
Apesar de, na fase de inquérito, este processo não ter sido qualificado como sendo “de especial complexidade”, ele foi depois considerado prioritário, uma vez que o arguido se encontra em prisão preventiva, cujo prazo máximo ocorrerá em Agosto.
Num despacho de 22 de Março, emitido a propósito da greve dos oficiais de justiça e ao qual a agência Lusa teve acesso, é justificado que este processo tem “inúmeros intervenientes (várias dezenas), crimes graves em apreciação (vários homicídios na forma tentada, incêndio, explosão, detenção de arma proibida, etc.), inúmeros ofendidos e pedidos de indemnização civil com elevada complexidade”.
O taxista terá provocado o fogo e as explosões dias depois de ter sido notificado de que, às 15h00 de 16 de Fevereiro, um agente de execução se deslocaria ao imóvel que foi construindo ao longo dos anos, no decurso do seu casamento, e que tinha estruturas para habitação e anexos, nomeadamente uma dependência contígua utilizada para garagem e serralharia e uma adega.
A acusação refere que o arguido queria “não só impedir que o agente de execução levasse a cabo a diligência de tomada de posse dos bens, mas também, e sobretudo, que os mesmos fossem vendidos e que o valor da venda revertesse, pelo menos em parte, para a sua ex-mulher”.
Segundo o Ministério Público, o homem “nunca concordou com a decisão judicial das partilhas”, nem com a venda do imóvel, e “formulou o propósito de destruir todos os bens e construções existentes naquele prédio, pondo-lhes fogo, de molde a nada restar, além do próprio terreno, para vender”.
Com esse intuito, engendrou um plano de destruição e, pouco tempo antes da hora marcada, deslocou-se ao local da serralharia e garagem anexo à habitação onde tinha “matéria combustível altamente inflamável e propícia ao desencadear de um violento e perigoso incêndio”.
Dois carros, um tractor, um motociclo, várias garrafas de gás, maçaricos, recipientes de diluente e tintas e madeiras encontravam-se no local, onde derramou gasolina para o chão e para cima dos veículos.
A acusação refere ainda que, para concretizar o seu propósito, o arguido fabricou “dois artefactos incendiários improvisados (coktails molotov)” e “tamponou a lareira da cozinha com mantas e outras peças de têxtil” para impedir a saída para o exterior do gás expelido pelos bicos do fogão, que deixou abertos.
A sua intenção era, “com a ajuda do fogo”, provocar “uma explosão e um incêndio daquele espaço e posterior explosão, por acção do fogo, de duas botijas de gás” que lá se encontravam.
No entender do Ministério Público, o taxista foi “motivado pelo interesse mesquinho de destruir tudo o que conseguisse para impedir que uma decisão do Tribunal fosse cumprida”.
Os operacionais apenas não morreram porque foram “prontamente assistidos no local e no hospital” ou porque “foram atingidos em zonas e órgãos não vitais”.