Home - Educação - “[Temos de] alertar para a necessidade de políticas que valorizem e dinamizem o nosso território [interior de Portugal]”

“[Temos de] alertar para a necessidade de políticas que valorizem e dinamizem o nosso território [interior de Portugal]”

Com 22 anos, o jovem oliveirense Michael Nunes está no último ano de mestrado em Engenharia mecânica na Universidade de Aveiro (UA) e acaba de ajudar aquela instituição de ensino a conquistar um inédito segundo lugar no Europeia Tornament in Management and Engineering Skills (T.I.M.E.S.) que decorreu em Viena, na Áustria. Esta é a maior e uma das mais reputadas competições da Europa de resolução de casos de estudo, contando anualmente com a participação de cerca de 1500 alunos. “O facto de sermos vice-campeões e, assim, conseguirmos levar Portugal e a nossa instituição de ensino ao pódio da competição deixou-nos bastante orgulhosos”, conta em entrevista ao CBS, ao mesmo tempo que se mostra preocupado com o que se passa no interior do País. “É uma situação preocupante e que, de resto, acaba por ser o motivo de alguma da minha envolvência política e de outros jovens da minha idade”, refere este elemento ligado à Juventude Popular, considerando que “as baixas remunerações aliadas a lentas progressões na carreira, são muitas vezes o que leva os nossos jovens a emigrar”. Na UA, Michael integrou o projecto Motochanics, que consistiu em desenvolver e construir uma moto de competição ao longo de dois anos e, actualmente, integra o Movimento Júnior, através do cargo de presidente da Júnior Empresa da UA, Aveiro Smart Business.

CBS – Pela primeira vez a Universidade de Aveiro chegou à final do T.I.M.E.S. Qual a importância deste resultado?
Michael Nunes – O TIMES é uma competição que existe desde 1994, pelo que termos sido os primeiros a alcançar a final desta competição ao fim de tantos anos, tem um significado especial. Apesar de ambicionarmos sempre o primeiro lugar, o facto de sermos vice-campeões e, assim, conseguirmos levar Portugal e a nossa instituição de ensino ao pódio da competição deixou-nos bastante orgulhosos e com um sentimento de missão cumprida.

Esta demonstração de capacidade para solucionar problemas em áreas importantes numa montra internacional pode ajuda a abrir portas no mercado de trabalho para quem está a terminar o ensino superior?

O quotidiano de um engenheiro numa empresa, independentemente da sua área de actuator, passa muito pela resolução de problemas. Isto faz com que as empresas procurem cada vez mais ter acesso a estas competições e aos currículos dos participantes. Contudo, creio que a principal vantagem está nas competências que adquirimos enquanto participantes, e que decerto farão diferença quando formos confrontados com o mundo do trabalho.

Como é que surgiu a oportunidade de participar neste evento?

A ideia de participar nesta competição surgiu no verão passado numa conversa de café de final de tarde com os meus colegas de estágio. Sabíamos da reputação que a competição tem entre os estudantes europeus e decidimos aí formar uma equipa para participar.

Foram importantes as sinergias pelo facto de serem alunos de cursos diferentes?

O facto de sermos de áreas de estudo distintas, e de cada um de nós ter diferentes competências e experiências ao longo do seu percurso académico, foi uma grande mais-valia e traduziu-se num equilíbrio muito grande da equipa.

Qual a sensação de estar a competir com os melhores alunos a nível internacional?

É uma sensação de satisfação e de desafio que nos motiva a colocar o melhor de nós em cada detalhe. Afluem a esta competição cerca de 1500 estudantes e, à medida que vamos avançando nas várias fases, sabemos que vão ficando apenas os melhores. Quando chegamos a uma fase final, onde apenas restam 36 estudantes, sabemos que a fasquia está muito elevada e que estamos a competir com alunos de competências muito notáveis.

Resumidamente quais foram as soluções que apresentaram para os dois problemas finais que lhes foram colocados Delloitte?

O primeiro problema consistiu em desenvolver uma solução de mobilidade futura para a BMW e a Daimler que lhes permitisse fazer face à crescente concorrência Norte-Americana e Asiática e às novas tendências de mobilidade. A nossa solução passou por apostar numa mobilidade digital e sustentável, integrada nos conceitos de MaaS (Mobility as a Service) e de Smart Cities. Defendemos ainda que esta solução de mobilidade, junto com os seus produtos, fosse vocacionada ao segmento Premium que sempre caracterizou estas marcas e lhes granjeou a boa reputação que conhecemos.

 “Além de possuírem conhecimentos sólidos, os nossos estudantes, talvez também por influência cultural, têm uma visão bastante prática e uma capacidade de superação de problemas bastante boa…”

E o segundo…

Esse foi mais vocacionado para a área da construção civil e das mudanças que o paradigma da escassez de mão-de-obra e do sector da construção lhe impõem. Aqui, pretendiam que contextualizássemos uma solução de futuro para a Komatsu, um dos maiores fabricantes mundiais de material para a construção civil, a par da Caterpillar. Aqui, a nossa solução passou pela apostas no desenvolvimento de produtos ICT (Information Communication Technology) e de um serviço de monitorização destes dados, recorrendo a conceitos de Data Analysis. Isto, a par com uma estratégia de marketing direccionada aos mercados Europeu e Norte-Americano onde, além da mais acentuada escassez de mão-de-obra, haverá em poucos anos uma necessidade muito grande de recondicionamento de vias de comunicação rodoviárias e ferroviárias, dada a idade das atuais infra-estruturas. Além disso, estamos perante países com tecnologias de comunicação 4G e 5G, capazes de suportar este crescente conceito de “Smart Construction”.

Pelo que tem visto, o ensino em Portugal, particularmente em áreas como a engenharia ou ciências, oferece os mesmos recursos que as universidades dos países, por exemplo, do Norte da Europa ou dos Estados Unidos?

Em relação às universidades do centro e Norte da Europa, com as quais tenho contactado mais de perto, percebe-se que estão realmente mais bem capacitadas em termos de recursos físicos e de infra-estruturas de apoio ao aluno. A título de exemplo, ainda há cerca de dois meses tive a oportunidade de ir a Eindhoven (Países Baixos) realizar uma formação, e deparei-me com um campus universitário de excelência, muito bem apetrechado para actividades de investigação e desenvolvimento.

E a qualidade do ensino?

Felizmente, a qualidade do ensino não sofre da mesma discrepância. Além de possuírem conhecimentos sólidos, os nossos estudantes, talvez também por influência cultural, têm uma visão bastante prática e uma capacidade de superação de problemas bastante boa. Claro, há situações onde os recursos que temos ao nosso dispor limitam inevitavelmente os desenvolvimentos que conseguimos alcançar, nomeadamente ao nível da investigação. Mas em termos de qualidade de ensino não vejo que estejamos atrás dos melhores.

Considera importante o intercâmbio com entre estabelecimentos de ensino internacionais durante o percurso académico dos alunos?

Sim. Viajar e ter a oportunidade de conhecer outras realidades e pessoas de contextos culturais diferentes é sempre uma excelente oportunidade de enriquecimento pessoal que recomendo vivamente. Num mundo cada vez mais globalizado, estas oportunidades ao longo percurso académico constituem uma mais-valia na noção do mundo que nos rodeia e acabam por trazer um impacto positivo ao nosso desempenho profissional. Além disso, são uma excelente oportunidade para conviver com outros jovens, trocar ideias e estabelecer contactos.

“É uma situação preocupante [o actual estado do interior do País] e que, de resto, acaba por ser o motivo de alguma da minha envolvência política e de outros jovens da minha idade. Procurar alertar para a necessidade de políticas que valorizem e dinamizem o nosso território”.

 Está a tirar o mestrado em engenharia mecânica. O que o levou a seguir este curso e em que aspectos tem mais impacto na vida das pessoas?

O facto de ter familiares ligados à área da mecânica, aficionados por automóveis e pela sua profissão, levou-me a desenvolver um gosto por esta área e despertou em mim a curiosidade de perceber como “as coisas funcionam”. Por outro lado, apercebi-me que Engenharia Mecânica era muito mais que automóveis e que me permitia desenvolver competências em diversas áreas. Conhecimentos relacionados com desenvolvimento de produto, electrónica, automação, térmica de edifícios, desenho técnico, processos de fabrico, mobilidade e gestão de operações fazem parte do plano curricular. É uma formação bastante capacitante que nos prepara para os desafios da sociedade no futuro, como a digitalização e a sustentabilidade. Actualmente, estou a finalizar o mestrado mais vocacionado para a área da mobilidade e das vias de comunicação do futuro, um tema que impacta bastante a vida das pessoas. Enquanto seres humanos, temos uma necessidade constante de nos movermos e de transportarmos bens de um local para outro. É impensável imaginarmos um mundo estático e a engenharia está na essência da nossa mobilidade!

Enquanto engenheiro mecânico qual é o seu grande objectivo?

O grande objectivo será contribuir para o desenvolvimento de soluções que impactem o quotidiano das pessoas, da sociedade em geral, e que possam ajudar a ultrapassar alguns dos maiores desafiamos com que actualmente nos confrontamos.

É de Oliveira do Hospital. Do interior. Acredita que o seu futuro pode passar por esta região ou terá de ir para um dos grandes centros ou mesmo para o estrangeiro?

De um modo geral, o interior de Portugal atravessa um Inverno demográfico que, infelizmente, o está a deixar despovoado e para o qual contribui a crescente concentração de empregos nos grandes centros urbanos do litoral, nomeadamente ao nível do emprego qualificado. Oliveira do Hospital não é excepção. Quando juntamos a isto, a carência de acesso a cuidados de saúde ou a debilidade das vias de comunicação, torna-se difícil atrair os jovens ao interior do país. É uma situação preocupante e que, de resto, acaba por ser o motivo de alguma da minha envolvência política e de outros jovens da minha idade. Temos de procurar alertar para a necessidade de políticas que valorizem e dinamizem o nosso território.

“[temos] de reverter esta ideia de que somos um país atractivo pelo baixo custo da mão-de-obra não qualificada”

A título de curiosidade, também os outros três jovens que participaram comigo nesta competição (TIMES) são do interior, da região de Trás-os-Montes. E também eles partilham desta preocupação acerca da assimetria que temos entre o litoral e o interior do país. Acaba até por ser estranha a existência desta assimetria, num país que dista apenas cerca de 300 quilómetros entre a costa e as suas fronteiras terrestres do interior. É a prova de que algo tem falhado na gestão do nosso território. O meu futuro não sei, mas estou muito preocupado com o que se passa com o interior do nosso país.

É frequente falar-se que Portugal perde grande parte da sua mão de obra mais qualificada para o estrangeiro. Partilha dessa opinião?

É uma realidade com a qual concordo e com que contacto frequentemente. No entanto, também reconheço que se tem vindo a trabalhar no sentido de criar mais empregos qualificados, novos de centros de competências e de reverter esta ideia de que somos um país atractivo pelo baixo custo da mão-de-obra não qualificada.

E o que mais poderia ser feito para reter os talentos em Portugal?

Há ainda um longo caminho a percorrer. Além da criação destas oportunidades, há também que valorizar a nossa mão-de-obra e dar-lhe as condições que esta procura. As baixas remunerações aliadas a lentas progressões na carreira, são muitas vezes o que leva os nossos jovens a emigrar. E, o que tenho vindo a observar, é que o custo de vida português está a ficar bastante equiparado ao de outros países europeus, onde a realidade salarial é completamente diferente. O futuro passa por aprofundar a interacção entre as instituições de ensino e o tecido empresarial do país. Passa também por uma revisão da nossa política de impostos e pelo estabelecimento de um plano estratégico para o país, alinhado com os seus recursos e com o panorama económico mundial. Têm de ser tomadas medidas. Quanto mais se adiar a resolução destes problemas pior será para o país.

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