Já lá vão muitos anos, mas até agora nunca se conheceu um plano para reflorestar e devolver a vida a um dos locais mais belos – e com forte aptidão turística – do concelho de Oliveira do Hospital.
Estrangeiros rendem-se ao encanto do Vale
Com uma deslumbrante vista sobre o Mondego, aqui e além avistam-se centenários socalcos de pedra feitos pelo homem que são um testemunho vivo do passado de uma agricultura de montanha. Da presença humana, já poucos são os vestígios. Os terrenos – outrora agricultados – estão cobertos de mato e as casas de pedra em ruínas. Ao longe, avistam-se já várias casas construídas por estrangeiros que vão trocando o buliço das cidades pelo encanto do vale. Uns trazem os outros…
Calcorreando as estradas florestais em terra batida – muitas delas abertas pela câmara municipal para a realização de troços de ralis –, descobrem-se aldeias genuinamente beirãs mas despovoadas e em avançado estado de ruína. Mas por perto, há quase sempre um estrangeiro que se apoderou de um pedaço de património a que os portugueses, pura e simplesmente, não ligam. É o caso da aldeia de Vale do Ferro. Também próxima da margem esquerda do Mondego, está uma das mais belas jóias arquitectónicas da zona. Trata-se da aldeia do Vieiro, que é composta por um conjunto de singulares casas centenárias em granito aparelhado. O aglomerado, erguido num local de rara beleza da freguesia de Ervedal da Beira a que se acede através de Póvoa de S. Cosme, está na posse de privados mas a falta de meios financeiros tem impedido o avanço de um projecto de reconversão da antiga aldeia num espaço turístico.
Património ao abandono
Mas neste território, que é hoje uma espécie de terra de ninguém, predomina também um importante património arqueológico que nem sequer está inventariado quanto mais protegido. Em pleno rio – conforme documentam as imagens – erguem-se as ruínas de uma antiga fábrica de papel, com um corredor e dois arcos de granito – a sua configuração é muito idêntica ao arco romano da Bobadela – ainda em bom estado de conservação. No local, uma placa avisa: “É proibido tirar pedras”. Para a zona está prevista a construção de uma mini-hídrica que, se não forem tomadas medidas, certamente inundará o monumento.
Na margem do rio – onde o barulho das suas águas a galgarem os açudes vale ouro –, há vários moinhos onde antigamente as populações moíam os cereais. Estão todos ao abandono…
Areeiros abrem feridas na paisagem
No cimo da montanha, observa-se o Crasto do Vieiro. Com milhares de anos, reza a história que “neste povoado fortificado viveram populações celtizadas”. A Penha do Vieira, acessível através da Póvoa de S. Cosme, é também um lugar único com o estatuto de miradouro natural. O acesso àquela curiosa formação granítica – onde predomina o quartzo – é difícil: as árvores queimadas pelo fogo, travam os acessos e o mato é extenso. Não há qualquer sinalização condigna no local.
Paralelamente ao estado de abandono do vale, ao longe vêem-se as feridas abertas na paisagem pelas empresas que se dedicam à extracção de inertes. Uma foi recentemente encerrada, mas a outra – na margem esquerda do rio – continua a laborar. Em plena Rede Natura 2000.
Henrique Barreto
Fotos: João Sargo