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“Sou testemunha de pessoas que têm feito das tripas coração para preservar o Queijo Serra da Estrela”

 

A consideração é unânime e resultou da conferência realizada, ontem à noite, no auditório da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Oliveira do Hospital e que juntou à mesma mesa autarquia, ANCOSE, produtor, QUALIFICA e direcção regional da Agricultura: os produtores de Queijo Serra da Estrela são diariamente confrontados com um excesso de exigências.

“Sou testemunha de pessoas que têm feito das tripas coração para preservar o Queijo Serra da Estrela”, afirmou o presidente da Câmara Municipal de Oliveira do Hospital, reconhecendo o esforço dos produtores concelhios que “não conseguem viver sem dinheiro e não podem estar a acumular prejuízos”.

Para inverter o ‘cenário negro’ que se abate sobre esta actividade, José Carlos Alexandrino disse ter ontem participado numa reunião com o secretário de Estado da Agricultura com quem abordou “esta problemática” nomeadamente o “conjunto de exigências inerente ao processo de certificação”.

É que, na opinião do presidente do município, a existência de apoios estatais poderia ajudar a reconverter o sector e até fazer da pecuária “uma profissão de futuro”, num concelho onde “o desemprego é brutal”.

Responsável pela abertura dos trabalhos, o autarca anunciou ainda os esforços que estão a ser desenvolvidos no sentido de se criar uma central de tratamento de efluentes de queijarias. “Está-se a fazer um estudo de viabilidade”, referiu Alexandrino, mostrando-se “preocupado com os problemas ambientais”.

Entre os objectivos do autarca está ainda a vontade de criação de uma “plataforma de desenvolvimento da floresta e da agricultura” que, no entender de Alexandrino “poderá ser muito importante para Oliveira do Hospital”.

Apostado em defender os interesses dos oliveirense, o edil garantiu que a Câmara Municipal “será sempre uma porta aberta para a resolução dos problemas”.

“Há uma coleira de ferro que dá cabo dos produtores”

Muito crítica em relação à política desenvolvida pelo ministério da Agricultura nos últimos anos, a secretária-geral da QUALIFICA denunciou a série de entraves com que os produtores têm que lidar diariamente e que são “os mais terríveis da Europa”.

Para além de toda a carga burocrática e custos que isso implica aos produtores – “há uma coleira de ferro que dá cabo dos produtores”, referiu – Ana Soeiro apontou o dedo ao excesso de “falsificações” do produto.

“Temos um país inundado de queijos com um trapo à volta, a fazer de conta que são Queijos Serra da Estrela, mas não são”, observou aquela técnica superior lamentando a inércia da Autoridade da Concorrência e da própria ASAE.

“99 por cento dos queijos são falsificados e os produtores não conseguem lutar contra isto”, continuou, lamentando que os produtores estejam “muito dispersos” e as organizações sejam “muito frágeis”.

Verificando que a nível local existe pouca informação acerca de um produto que é de excelência, Soeiro chegou a considerar que as câmaras municipais poderiam “ajudar mais um bocadinho do que aquilo que ajudam”. E, neste domínio, não deixou de criticar os responsáveis pela elaboração do cartaz promocional da conferência, onde é exibida uma fotografia de um queijo aberto no topo. “Isto é uma fotografia para enterrar o Queijo Serra da Estrela”, referiu, informando que “não é assim que se come queijo” e advertindo que “estas ignorâncias se podem pagar muito caro”.

“Não há pessoal para trabalhar na agricultura e nas queijarias”

Especificando que está em causa uma região que é responsável pela produção anual de cinco milhões de litros de leite para produção de queijo, o técnico da ANCOSE João Madanelo foi também unânime em considerar que se trata de uma realidade “demasiado importante para que não haja uma posição concertada”.

Acabaram, contudo, por partir do produtor local Paulo Rogério os principais sinais de preocupação quer ao nível dos custos, quer de falta de pessoal para trabalhar na pecuária. “Dá a sensação que somos a raia miúda”, referiu o proprietário da Quinta da Cobrançã, que disse que é preciso “muito gosto para estar ligado à pecuária”, já que “as dificuldades, os problemas e as horas de trabalho são muitos”.

Os preços de venda do produto que continuam inalterados desde há 10 anos e os custos inerentes à certificação, foram apontados por Paulo Rogério como os principais entraves à produção, acrescidos dos restantes custos e penalizações decorrentes das vistorias. “Certifiquei apenas 600 queijos porque não tenho escoamento para mais”, referiu.

“Se não passarmos do discurso político à prática, os senhores produtores não estarão cá por muito mais tempo”

Em substituição do director regional de Agricultura e Pescas do Centro, Fernando Martins deu conta do trabalho que está a ser desencadeado no sentido de se resolverem os problemas que afectam os produtores.

Verificando que “dificilmente, as pessoas conseguirão continuar neste estado muito mais tempo, porque a remuneração não é compensadora”, o dirigente anunciou o esforço conjunto com outras entidades, nomeadamente autarquias e associações ligadas à produção com vista a “ultrapassar problemas e exigências desproporcionadas”.

Crítico relativamente ao processo inerente à distribuição do produto junto das grandes superfícies comerciais, Fernando Martins destacou a necessidade de regulação. “Se não passarmos do discurso político à prática, os senhores produtores não estarão cá por muito mais tempo”, considerou o dirigente. Neste sentido, o executivo oliveirense aprovou ontem um “acordo de princípios” com a direcção regional de Agricultura, composto por um conjunto de “propostas concretas” destinado a defender e a promover o produto.

Presente entre o público, também o presidente da ANCOSE denunciou o excesso de entraves colocados aos produtores e no que respeita à certificação, disse não compreender a motivo pelo qual não pode ser aquela Associação a desenvolver esse trabalho junto dos produtores e a “um preço simbólico”.

“Estou preocupadíssimo com o Queijo Serra da Estrela e com o futuro dos meus produtores”, referiu Manuel Marques que também aproveitou para considerar que o termo “trapo” usado por Ana Soeiro é “muito diminutivo”.

Enquanto parceiro da Câmara Municipal na organização da conferência, o director do Diário As Beiras colocou a tónica na importância da certificação. “É um registo de qualidade e, se for bem feito, é sempre uma referência para quem está a consumir”, considerou António Abrantes.

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